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Receita das Associações: o que propomos

 

De maneira geral, os titulares de direito não têm conhecimento da importância da fidelidade associativa para a receita das Associações de música no Brasil. Tampouco têm conhecimento do que essa receita representa no contexto do universo de decisões que uma Associação deve tomar para o benefício de seus titulares, tanto aqueles com maior ou menor representatividade econômica para a Instituição.

 

Por essa razão vimos a necessidade de escrever este artigo e levar até você, titular de direito, nossa preocupação acerca desse assunto.

 

Em primeiro lugar, devemos esclarecer que, conceitualmente, toda receita de uma associação de gestão coletiva, independentemente da natureza da gestão, advem do montante arrecadado pela Instituição junto aos usuários das criações que a Instituição administra. Ou seja, o usuário paga à Associação de Gestão Coletiva pelo uso das criações sob sua administração e, como resultado, uma parte deste valor pago (arrecadado) é destinado à manutenção da Instituição, e outra é destinada ao repasse dos direitos autorais devidos aos criadores e/ou titulares de direito.

 

 

Como isso funciona para as Associações de Música no Brasil?

 

No Brasil, diferentemente do que é praticado em outros países, as Associações de Música unificam a cobrança junto aos usuários num ente arrecadador único: o ECAD. Essa unificação é exclusiva para fins de arrecadação de Execução Pública Musical.

 

Na prática, essa unificação em torno do ECAD se dá por três motivos essenciais:

 

  • O primeiro é a obrigatoriedade legal. As Leis que regem a Gestão Coletiva no Brasil, para execução pública musical, determinam que a mesma seja feita por meio de um único ente arrecadador. 

  • O segundo remete à questão do chamado "repertório compartilhado". Como uma mesma obra e/ou fonograma podem ser adminstrados por mais de uma Associação de Gestão Coletiva, a não-unificação da cobrança pode levar à divergência na fixação do preço pelo uso. A unificação, no entanto, garante a todos os titulares de uma mesma obra e/ou fonograma, igual remuneração pelo uso de seu repertório, observando-se, obviamente, os percentuais de reparto de cada titular. Aqui, "igual remuneração" refere-se ao preço fixado pela totalidade da obra/fonograma, não abrindo precedentes para que uma parte cobre, pelo seu quinhão, mais do que a outra, assim como garante que o valor cobrado será proporcionalmente repartido entre os titulares de direito, de acordo com os percentuais de participação de cada um.

  • O terceiro é a força dessa cobrança junto aos usuários. Cobrado de maneira unificada, o sistema se fortalece como um todo, pois a cobrança, coletivamente exercida, têm o peso da representatividade de todo o conjunto de titulares de direito, independentemente de seu vínculo associativo. A adesão, neste caso, é ao sistema de Gestão Coletiva. O ECAD age como ente que representa a totalidade dos titulares-membro do sistema de Gestão, protegendo não apenas os titulares filiados às Associações, mas também aqueles ainda não vinculados a nenhuma Instituição de Gestão Coletiva. 

E onde entra a receita do ECAD e Associações?

 

A receita do ECAD e Associações é calculada em duas etapas: a primeira no momento da arrecadação e a segunda no momento da distribuição. 

 

Ao fazer a arrecadação, o ECAD deduz do valor bruto arrecadado diretamente dos usuários de música, o montante de 15%. Desse montante, 10% destina-se à manutenção do ECAD e 5% à manutenção das Associações.

 

No caso das Associações, no entanto, dos 5% destinado à remuneração de todas, a participação de cada uma é feita com base no resultado da totalidade da receita repassada aos titulares a ela filiados. Ou seja, não se trata de um montante subdividido equitativamente entre as Associações que compõe o ECAD, mas de um montante subdividido proporcionalmente entre as Associações, a partir do resultado individual de cada titular. Em outras palavras, o resultado financeiro individual do titular se transforma no indexador que irá referenciar a participação de cada Associação sobre a totalidade do montante financeiro que deve ser divido entre todas.

 

Imperativo enfatizar aqui que o resultado individual do titular referencia o valor que será repassado à Instituição. Ou seja, não se trata de DESCONTO sobre o valor do repasse do titular, mas tão somente de um valor de REFERÊNCIA para efeito de cálculo do percentual que deverá ser destinado à Associação que o representa.

 

Ao valor destinado às Associações dá-se o nome de "Percentual Societário".

Por que entendemos que é necessária uma reforma?

 

Uma vez que os valores calculados para a composição da receita da Associação (o chamado "Percentual Societário") têm unicamente como referência o resultado financeiro individual do titular sobre os direitos disribuídos, e uma vez que as Associações de Gestão Coletiva têm a obrigação de trabalhar para a totalidade do sistema de Gestão Coletiva, independentemente do vínculo associativo do titular e/ou seu resultado financeiro individual, em nosso entendimento, várias distorções são geradas para efeito de remuneração das Associações.

 

Vamos a elas:

1.  A obrigação das Associações de Gestão Coletiva

A primeira distorção que observamos no atual modelo diz respeito às obrigações das Associações de Gestão Coletiva.

 

Todas as Associações, indepentendemente da quantidade de titulares que administre, do resultado individual financeiro de seus titulares, ou da natureza dos direitos que administre (se autorais e/ou conexos), têm uma série de obrigações a cumprir perante o ECAD, o sistema nacional e internacional de Gestão Coletiva, seus próprios titulares, assim como as obrigações legais, administrativas e trabalhistas de qualquer empresa legalmente constituída.

Neste sentido, o modelo atual de remuneração não guarda, às Instiuições, qualquer garantia de manutenção de sua receita, tampouco imputa ao titular qualquer responsabilidade sobre a manutenção da Instituição à qual esteja filiado. Por quê? Por causa da prerrogativa legal de livre associação dos titulares de direito. Ao se filiar a uma instituição, no modelo atual, é o resultado financeiro individual do titular que servirá de referência para a composição da receita institucional, embora o vínculo do titular com a Instituição possa ter um caráter transitório.  

Isso traz uma enorma insegurança financeira para as Instituições.

Uma vez que o peso da responsabilidade sobre a remuneração associativa recai sobre o resultado individual do titular e não sobre a capacidade financeira do próprio sistema, as Instituições são pesadamente prejudicadas pelo contínuo trânsito de titulares entre as Associações.

Lembremos que o titular não têm obrigações financeiras perante a Associação à qual está filiado. Pode ir e vir, de uma a outra, no momento que bem lhe aprouver. A instituição, no entanto, ao "perder" um titular, perde com ele um "índice de referência" para sua remuneração, embora continue a ter que trabalhar, de igual maneira, com a mesma competência e capacidade produtiva, para a totalidade do sistema de Gestão Coletiva, em nome não apenas de seus titulares, mas de todos os titulares representados pela coletividade da gestão.

2. A inversão lógica da relação arrecadação x distribuição

O sistema de Gestão Coletiva não pode trabalhar economicamente contra as Instituições que trabalham para que ele exista. 

 

Neste sentido, se a receita que mantém a totalidade do sistema advem da arrecadação, a qual é feita unificadamente, em nome de todos os titulares de direito, de maneira isonômica, e para o seu igual benefício, por meio das Associações, como pode, a remuneração advinda dessa arrecadação coletiva unificada, basear-se, exclusivamente, no resultado individual do titular?

 

Há aí uma contradição lógica muito simples de se estabelecer: se a totalidade das Associações está representada unificadamente para precificar, de forma coletiva, o uso de seus repertórios, a remuneração a elas devida deveria ser calculada, também, sobre o resultado total da arrecadação, e não somente sobre o resultado individual da distribuição. 

 

Caso contrário, as instituições estarão sendo privadas da remuneração que lhes é devida pelo trabalho que fazem em benefício e em prol da totalidade do sistema de gestão coletiva, e não somente em benefício exclusivo dos titulares que representa. 

 

 

3. O sistema não remunera as Associações pelo trabalho que empenham, apenas pelas execuções efetivamente captadas para distribuição

O trabalho das Associações de Gestão Coletiva transcende em muito o universo de execuções captadas pelo ECAD.

Somos membros ativos de um sistema que exige de nós o contínuo aprimoramento profissional, a participação em comissões técnicas em muitas instâncias e órgãos, tanto nacional quanto interncaionalmente, além de toda consultoria que prestamos ao titular para tudo o que se relaciona à gestão de seus direitos. 

Também temos a obrigação de atender ao titular independentemente do alcance de seu repertório, dentro do sistema de gestão coletiva e, muitas vezes, trabalhar na dispensa de cobrança dos direitos autorais, em outras palavras: trabalhar para não receber. Além disso, a maior parte da receita de distribuição, hoje, advem de rubricas cuja captação é de natureza amostral. Como é também sabido, as composições amostrais, como o próprio nome já diz, não refletem a totalidade das execuções musicais, mas tenta identificar uma composição de execuções que referencie essa totalidade.

 

Some-se a isso o altíssimo índice de execuções não identificadas (os chamados "créditos retidos"), uma questão que é inerente ao sistema, mas que impacta brutalmente sobre a receita das Associações na medida em que impedem que a totalidade dos 5% destinados à manutenção das entidades sejam de fato distribuídos entre elas. Isso significa dizer 

Por conta disso, ao indexar a remuneração associativa exclusivamente a partir do universo de execuções captadas, o sistema não protege as Associações das dispensas de cobrança, dos hiatos nas captações, e não remunera as Associações por todo trabalhado empenhado para a manutenção e acompanhamento das execuções pelo ECAD, independentemente de sua captação, o que, em nosso entendimento, não é correto.

4. A liberdade de decisão versus o conflito de interesses

A quarta e derradeira distorção que observamos refere-se a uma questão fundamental: o conflito de interesses.

Uma vez que o sistema deve trabalhar na defesa da totalidade dos interesses dos titulares de direito, a remuneração exclusivamente baseada no resultado financeiro individual do titular de direito acaba por "pautar" os interesses das Instituições individualmente, favorecendo, dessa forma, no âmbito das regras que norteiam o funcionamento do sistema como um todo, a tomada de decisão com base em interesses individuais em detrimento dos interesses coletivos.

 

Em outras palavras, as Associações que detêm em seu quadro associativo titulares economicamente muito superiores em relação aos demais, serão pautadas muito mais pelos interesses desses titulares, individualmente, do que pelo interesse do conjunto de todos os titulares representados, coletivamente, pela totalidade das Associações. 

 

Tais interesses ferem, muitas vezes, o princípio do tratamento isonômico aos titulares, e tiram das Instituições a imparcialidade e segurança de poder votar assuntos que transcendam aqueles de seu exclusivo interesse econômico.

 

Isso foi um enorme problema, por exemplo, até o advendo da Nova Lei.

 

Até a recente publicação das Portarias e Instruções Normativas que regularam a Lei 12.853/2013 (Lei da Gestão Coletiva), o voto associativo na Assembleia Geral do ECAD era fundamentado exclusivamente no resultado financeiro individual das Associações.  Isso significava, na prática, que a vontade exercida pelo voto associativo na Assembleia Geral do ECAD representava não a maioria quantitativa dos titulares de direito representados na gestão, mas o valor econômico advindo de suas receitas individuais. Ou seja, quanto mais forte economicamente, mais votos (poder político) tinha a Associação. A este sistema de representação é dado o nome de "Voto Plural", ou "Voto Censitário".


Por causa disso, durante anos as disputas entre as Associações trouxeram ao negócio da Gestão Coletiva um caráter de competitividade predatória, extremamente nocivo para o sistema. O poder político, vinculado exclusivamente ao poder econômico da instituição, fragilizava a representatividade isonômica da totalidade dos titulares de direito.

 

Isso se resolveu parcialmente com o advento da Lei 12.853/2013, que instituiu o voto único por Associação. Hoje, diferentemente de poucos meses atrás, cada Associação tem um voto. Seu "tamanho" econômico não mais determina seu poder político. Isso, de certa maneira, amenizou o problema da representativade na Assembleia Geral, mas não resolveu a questão fundamental: o esvazimento econômico das Associações.

 

A representatividade política das instituições, isonomicamente garantidas pelo voto único, deveriam, na visão da ASSIM, ser corroboradas por um princípio que garantisse, também isonomicamente, uma participação na receita total gerada pelo sistema de gestão coletiva. De outra maneira, não seria possível assegurar que todas as decisões tomadas pelas Associações não sejam exclusivamente pautadas pelos interesses econômicos individuais, em detrimento dos interesses econômicos coletivos.

 

 

E qual é a proposta da ASSIM para resolver estes impasses?

 

É simples: que uma parte da receita das Associações seja dividida em partes iguais, entre todas as Associações, e uma outra parte, seja dividida proporcionalmente entre as Associações, a partir do resultado financeiro individual de seus titulares.

 

Ou seja, propomos uma remuneração composta.

 

Hoje, 100% do percentual societário é indexado, exclusivamente, pelo resultado financeiro individual dos titulares. Nossa proposta é que 15% do percentual societário seja dividido igualitariamente entre as Associações e 85% seja distribuído proporcionalmente entre as Associações. Uma mudança pequena, cujo resultado, no entanto, faria uma enorme diferença na saúde financeira (e por que não dizer na política também!) de todas as Instituições.

 

Essa fórmula de receita não teria qualquer impacto na receita do titular (atenção! Tudo o que aqui foi tratado refere-se, exclusivamente, à receita das Associações, a qual não se mistura à receita do titular!) e salvaguardaria o sistema como um todo, de maneira justa e isonômica, pois garantiria:

 

- A sobrevivência econômica das Instituições, independentemente do vínculo associativo de seus titulares;

- A independência de voto sobre assuntos que transcendam o interesse econômico particular de alguns titulares de direito;

- O tratamento isonômico aos titulares no âmbito das decisões da Gestão Coletiva;

- O planejamento financeiro da Instituição, bem como a garantia da manutenção de sua estrutura;

 

Isso só para começar!

 

Esse sistema de remuneração proposto pela ASSIM não é novidade para instituições de natureza Associativa e guarda semelhança com um dos mercados mais lucrativos que existe: o esporte.

 

As principais ligas de futebol européias, que têm como receita fundamental para manutenção de sua estrutura a distribuição de royalties dos direitos de transmissão dos jogos pela TV, reserva, por princípio, uma parte da arrecadação desses direitos para ser dividida igualitariamente entre os clubes e, o restante, conforme o "tamanho" econômico de cada um. Isso é feito para assegurar que os clubes maiores não dividam, exclusivamente entre eles, a totalidade desses royalties, garantindo, por consequência, a sobrevivência de todas as associações desportivas, independentemente de seus resultados individuais.

 

Retornando à Gestão Coletiva, o senso de justiça do modelo proposto pela ASSIM garantiria a sobrevivência das Instituições, a justa remuneração por seu trabalho e ainda guardaria, ao titular, o direito ao exercício de se fazer representar pela instituição que ele escolher, sem ter que se preocupar com a sobrevivência econômica dessa Instituição.

 

As filiações, neste sentido, ganhariam uma conotação de "afinidade política", que é hoje muito carente na Gestão Coletiva, e demandaria, tanto do titular quanto da Associação, uma relação mais aproximada e participativa. 

 

 

Bem, agora você já sabe o que defendemos sobre este assunto!

Gestão participativa é isso. Gestão com informação.

 

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